O jogo de Xadrez como Estratégia de Ação na gestão escolar participativa
Reflexão sobre a importância do jogo de Xadrez como estratégia de ação para uma gestão escolar.O texto publicado foi encaminhado por um usuário do site por meio do canal colaborativo Meu Artigo. Brasil Escola não se responsabiliza pelo conteúdo do artigo publicado, que é de total responsabilidade do autor . Para acessar os textos produzidos pelo site, acesse: https://www.brasilescola.com.
Resumo
Este artigo trago algumas reflexões colhidas a partir da realidade escolar e desenvolvidas durante os estudos realizados no PDE (Programa de Desenvolvimento Educacional do Estado do Paraná), turma de 2009, sobre a importância do jogo de Xadrez como estratégia de ação para uma gestão escolar participativa que possa contribuir para a qualidade do ensino através da participação das famílias dos alunos no dia-a-dia da escola. Para tanto, interrogo bibliograficamente as possibilidades de a gestão escolar participativa fornecer elementos de recusa aos apelos do capital na pós-modernidade e convido o leitor a um olhar reflexivo e esperançoso rumo à escola, numa perspectiva democrática. O desenvolvimento de práticas pedagógicas democráticas favorece aos alunos compreender as influências e transformações decorrentes da sociedade capitalista em que se vive. Nesse contexto, a gestão participativa propicia a concretização de uma sociedade mais justa, humana e igualitária. O Xadrez proporcionara novos conhecimentos para os pais, e também trabalharão questões como auto-estima, concentração, atenção, raciocínio lógico, etc. Porém a grande meta é resgatar os pais, para que participem no contexto educacional na formação dos seus filhos. A partir dessas discussões, pretendo subsidiar a fase de intervenção do PDE a ser desenvolvida no Colégio Estadual 29 de Abril, do município de Guaratuba, litoral do Paraná, com professores e pais dos alunos matriculados e freqüentes nas turmas das 5ª séries do Ensino Fundamental, no período da manhã, no ano de 2010.
Palavras-chave: Escola, gestão, democracia, xadrez, participativa.
Introdução
(...) a escola que se abre à participação dos cidadãos não educa apenas às crianças que estão na escola. A escola cria a comunidade e ajuda a educar o cidadão que participa da escola, a escola passa a ser um agente institucional fundamental do processo da organização da sociedade civil. (Francisco Weffort)
Este artigo tem por objetivo discutir algumas questões nascidas da inquietação face às diversas formas de desigualdades encontradas no interior da escola como reflexo da sociedade onde ela acontece e nossa recusa em aceitar essa situação como dada. Constitui, também, um manifesto de nossa esperança na possibilidade de transformação da realidade escolar depositada na perspectiva da gestão escolar participativa como forma de colaborar com a transformação da própria sociedade.
Traz algumas reflexões colhidas a partir da realidade escolar e desenvolvidas durante os estudos realizados no PDE (Programa de Desenvolvimento Educacional do Estado do Paraná), turma de 2009, sobre a relevância da contribuição do jogo de Xadrez como estratégia de ação para a efetivação de uma gestão escolar participativa que possa contribuir para a melhoria da qualidade do ensino através da participação permanente das famílias dos alunos no dia-a-dia da escola. No escopo destas questões, interrogo bibliograficamente as possibilidades da gestão escolar participativa fornecer elementos de recusa aos apelos do capital na pós-modernidade e convido o leitor a um olhar reflexivo e esperançoso rumo à escola.
A partir dessas discussões, pretendo subsidiar a fase de intervenção do PDE a ser desenvolvida no Colégio Estadual 29 de Abril, do município de Guaratuba, litoral do Paraná, com professores e pais dos alunos matriculados e freqüentes nas turmas das 5ª séries do Ensino Fundamental, no período da manhã, no ano de 2010.
Escola e democracia
A Escola não pode ser entendida de forma abstrata, isto é, como um lugar desconectado da vida real, mas como resultado e causa de um fazer de práticas pedagógicas. O mesmo pensamento pós-moderno que pulverizou as éticas sociais pulveriza também as éticas nos relacionamentos no interior da escola. Pensar o mundo de hoje é pensar o mundo da danação; um mundo do descartável, onde as próprias pessoas são vistas como peças substituíveis. A lógica do capital é metabólica: a forma com que se explora o trabalho hoje é diferente daquela do século XIX. Hoje ela é mais sutil. Se na Revolução Industrial os trabalhadores eram chicoteados pelo gerente de produção, hoje são eles mesmos que chicoteiam uns aos outros.
Uma escola cuja preocupação maior está em educar para atuação no mercado de trabalho ou para a aprovação em concursos vestibulares só pode ter seu trabalho analisado em função da classe social a quem satisfaz com sua ação. A escola democrática deve garantir um processo educativo que possibilite o educando refletir sobre si mesmo e sobre sua classe social. Na sociedade de desigualdades em que vivemos suas contradições serão reproduzidas no interior da escola. Nem por isso a escola deve deixar de ser um instrumento importante no processo de transformação desta mesma sociedade. "O sistema educacional de um país é o prolongamento de um sistema social e político. Em conseqüência não poderá estar mais atrasado ou mais adiantado do que este". (Gadotti, 1980, p.20).
Sabemos que a transformação de uma sociedade não depende unicamente da elaboração de planos ou projetos escolares. As lutas sociais se desenvolvem no terreno econômico e político da sociedade. Mas está justamente aí a necessidade da escola como elemento que coloca à disposição dos sujeitos sociais as informações necessárias para que possam transformar a sociedade. Como cita Gadotti, "A educação, não é certamente a alavanca da transformação social. Porém se ela não pode fazer sozinha a transformação (...) esta não se consolidará sem ela" (Gadotti, 1980, p.63). Nas palavras de Saviani (1989, p.66),
(...) se os membros das camadas populares não dominam os conteúdos culturais, eles não podem fazer valer seus interesses, porque ficam desarmados contra os dominadores, que se servem desses conteúdos culturais para legitimar e consolidar sua dominação. Em suma, o dominado não se liberta se não vier a dominar aquilo que os dominantes dominam.
Num mundo repleto de contradições, como é a sociedade pós-moderna, a escola deve preparar o futuro cidadão para a transformação da sociedade, sem, contudo, se colocar como a salvadora universal, pois ela “não é o local por excelência de correções das eventuais desigualdades sociais, mas é aquela onde é possível veicular conteúdos e conhecimentos que facilitam a proposição e a construção de novas relações sociais." (Mello & outros, 1985, p.8)
Pós-modernidade
A última metade do século passado assistiu a mudanças sem precedentes na forma do homem pensar e executar suas idéias. Ao lado de uma imensa sofisticação tecnológica dos meios de comunicação, a mundialização da economia (globalização) alterou significativamente o modo de se pensar a sociedade e a educação. Muitos defendem que este é um novo período da história, o primeiro que já nasce com nome: a pós-modernidade.
O ser humano pós-moderno se encontra mergulhado num mundo que proclama a si mesmo como redentor da humanidade pelo alastramento da comunicação. Entretanto, para além das aparências, não abdica da exploração econômica, da injustiça e da desigualdade. Referindo-se à assim chamada sociedade do conhecimento, Duarte (2003, p. 35-36) faz a seguinte citação:
Reconheço (...) que o capitalismo do final do século vinte e início do século vinte e um passa por mudanças e que podemos sim considerar que estejamos vivendo uma nova fase do capitalismo. Mas isso não significa que a essência da sociedade capitalista tenha se alterado, isso não significa que estejamos vivendo uma sociedade radicalmente nova, que pudesse ser chamada de sociedade do conhecimento. A assim chamada sociedade do conhecimento é uma ideologia produzida pelo capitalismo, (...) uma ilusão que cumpre uma determinada função: (...) a de enfraquecer as críticas radicais ao capitalismo e enfraquecer a luta por uma revolução que leve a uma superação radical do capitalismo, gerando a crença de que essa luta teria sido superada pela preocupação com outras questões “mais atuais”, tais como a questão da ética na política e (...) pelo respeito às diferenças.
Na pós-modernidade, sob o escudo do capitalismo, um contínuo e avassalador surgimento de conceitos inéditos e provisórios destitui as grandes crenças do passado em nome de um questionável relativismo onde as éticas, os fatos e a própria realidade parecem estar num verdadeiro corredor da morte. Nas palavras de Loureiro e Della Fonte (2003, p. 15-16):
A caracterização clássica do conceito de pós-moderno é a de Loyotard (2000). Segundo esse autor, o advento do pós-moderno se relaciona a mudanças amplas ocorridas a partir do final dos anos 50: o saber muda o estatuto ao mesmo tempo em que as sociedades entram na “idade pós-industrial” e a cultura na idade “pós-moderna”. (...) Lyotard considera pós-moderna a incredulidade em relação aos metarrelatos (...), do apelo da ciência a idéias de progresso e emancipação.
Para Bauman (1998), todas as sociedades sempre consumiram, mas aquilo que caracteriza a sociedade contemporânea é a ênfase dada ao consumo. De conformidade, Jameson (1985, p. 26) considera que "a emergência da pós-modernidade está estritamente relacionada à emergência desta nova fase do capitalismo avançado, multinacional e de consumo”. O perfil pós-moderno do modo de produção capitalista caracteriza um período onde as mudanças tecnológicas são tão amplas e rápidas que transgridem a capacidade humana de pensá-las, senti-las e ponderar sobre elas. Prepondera na pós-modernidade uma ética narcisista, onde os seres humanos perderam, principalmente nos grandes centros urbanos, o sentido social; eles não mais se socializam, ou se socializam de um modo minimizado e artificial. Não há lugar mais para os sentimentos de empatia e alteridade; os homens se tornaram indiferentes uns aos outros na marcha rumo ao consumo.
Segundo Frigotto (1996), os autores pós-modernos criticam o que chamam de “metanarrativas”, onde estariam incluídos o marxismo e o socialismo científico. Para a educação, a pós-modernidade defende a formação do professor “prático-reflexivo”, centrado na subjetividade, fundamento principal para o entendimento da realidade, segundo a pós-modernidade. A ênfase na subjetividade dos professores, em suas experiências pessoais, é aquela das “competências”, que busca por um profissional que no mesmo momento se torna tanto mais tecnicamente competente, quanto mais politicamente inoperante e adaptado. O professor “treinado” para saber “como” ensinar, não deve se preocupar com “o que” ensinar.
Escola e pós-modernidade
Sabemos que a escola não é uma ilha, mas parte da sociedade. Assim todo esse contexto de mudanças se fez refletir em seu interior. Se, há algumas décadas a escola pública se questionava apenas sobre seus métodos, limitando-se à escolha entre ser tradicional ou progressista, hoje ela se questiona também sobre seus fins. A crise de identidade da sociedade atual atinge a escola e ela se pergunta sobre si mesma, sobre qual o seu papel como instituição numa sociedade caracterizada pela globalização, por uma intensa revolução nas tecnologias da comunicação, pelo consumismo e pelo surgimento de conceitos inéditos, relativos e provisórios.
No mundo pós-moderno, o neoliberalismo “tem trabalhado para redefinir a democracia nos termos do livre-mercado, com os ‘consumidores’ escolhendo ‘produtos’ educacionais como interesses pessoais, e não como cidadãos que se mobilizam coletivamente pela educação como um bem público” (APPLE; BURAS, 2008, p. 14).
Combater as perspectivas que repercutem na escola a partir da sociedade contemporânea, pós-moderna/pós-industrial, de capitalismo tardio, por certo não é tarefa fácil. A escola precisa renunciar às idéias sedutoras da educação “prático-reflexiva”, imbricadas de ideais neoliberais e pós-modernos de tal modo que tem em seu corolário corroborar com a ideologia da sociedade capitalista contemporânea: o ceticismo epistemológico e a veneração da subjetividade. (DUARTE, 2003, p.612). Precisa desenvolver nos jovens atuais a capacidade crítica de ler seu tempo, articulando o conhecimento historicamente produzido à construção científica de novos conhecimentos, para que possam mudar o caráter desigual e injusto da sociedade onde estão inseridos.
Permitir que a comunidade escolar exerça seu direito à participação deve fazer parte dos objetivos de uma escola que se comprometa com a solidificação da democracia.
Gestão democrática da escola pública
A grande generosidade está em lutar para que, cada vez mais, estas mãos, sejam de homens ou de povos, se estendam menos, em gestos de súplica. Súplica de humildes a poderosos. E se vão fazendo, cada vez mais, mãos humanas, que trabalhem e transformem o mundo.
(Paulo Freire)
O tema da gestão escolar democrática vem sendo objeto de discussões entre educadores, especialmente a partir da promulgação, em dezembro de 1988, da Constituição Federal Brasileira que, em seu artigo 205, prevê que a educação seja promovida e incentivada com a colaboração da sociedade. O artigo 206 é mais explícito e no inciso IV do seu art.206 determina a “gestão democrática do ensino público, na forma da lei;”. Na década de 1990, a promulgação da nova LDB - Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional – Lei 9394/96, estabeleceu em seu art. 3º, inciso VIII, que a gestão democrática deve ser um dos princípios a reger o ensino. Desde então, na perspectiva de se adequar à legislação, as escolas vêm buscando a redefinição de seus espaços e de sua organização interna e externa.
A gestão democrática implica na descentralização do poder no interior da escola. O trabalho escolar deve ter uma ação coletiva, realizada a partir da participação conjunta e integrada de todos os segmentos da comunidade escolar no estabelecimento de objetivos, na solução de problemas, na tomada de decisões, na proposição, implementação, monitoramento e avaliação de planos de ação pedagógica.
Para que a gestão escolar seja verdadeiramente democrática ela necessita ter alguns requisitos básicos: eleição direta para a direção escolar; constituição do Conselho Escolar (CE); elaboração do PPP (Projeto Político Pedagógico) de forma coletiva e participativa; definição e fiscalização da verba da escola pela comunidade escolar; e transparência na prestação de contas através.
O Conselho Escolar é um colegiado com membros de todos os segmentos da comunidade escolar (alunos, professores, pais e funcionários) com a função de administrar coletivamente a escola. Tendo suporte na LDB, lei nº 9394/96 no Artigo 14, que trata dos princípios da Gestão Democrática no inciso II – "participação das comunidades escolar e local em conselhos escolares ou equivalentes", esses conselhos devem ser implementados como condição sine qua non para que se tenha na escola uma gestão democrática.
Para que os Conselhos Escolares não sirvam apenas para a discussão de questões burocráticas, ser compostos apenas por professores e diretor(a), como um ‘Conselho de Classe’, ele deve discutir politicamente os problemas reais da escola e do lugar onde ela se encontra inserida.
Através da gestão democrática se educa para a compreensão do próprio valor histórico. Mas, se a gestão democrática pressupõe a descentralização do poder, ela está longe de acontecer na escola pública brasileira. Diferente do que acontecia na escola unitária de Gramsci, onde o Estado assumia todas as despesas em busca do acesso igualitário ao conhecimento, entre nós, o Estado, ao assumir as despesas com o ensino reivindica também o controle da escola. E esse controle acontece através de seu representante autoritário: o diretor. Por isso, como considera Paro:
Se queremos uma escola transformadora, precisamos transformar a escola que temos ai. E a transformação dessa escola passa necessariamente por sua apropriação por parte das camadas trabalhadoras. É nesse sentido que precisam ser transformados o sistema de autoridade e a distribuição do próprio trabalho no interior da escola. (PARO, 2001, p. 10)
O desenvolvimento de práticas pedagógicas democráticas pode subsidiar o educando com meios imprescindíveis ao entendimento e enfrentamento da problemática onde este se encontra. Nesse sentido, reafirma os anseios e esperanças depositados por tantos pais e educadores numa escola pública que se coloque como promotora de uma sobrevivência digna para todos, como elemento indispensável ao resgate da sensibilidade humana, à formação de consciências críticas e à construção de uma sociedade democrática.
Contudo, se entendermos a educação como um processo de emancipação humana, pouco adianta o coletivo da escola discutir mecanismos de gestão democrática sem discutir antes sua concepção de sociedade. É preciso que se tenha claro que uma sociedade verdadeiramente democrática nada mais seria que uma enorme instituição pedagógica, um lugar permanente da formação de cidadãos autônomos que pudessem lidar eticamente com seus problemas pessoais e sociais. Ou, como consideram Sastre e Moreno, que tivesse a competência necessária para levar os educandos a
(...) conhecer melhor a si mesmos (as) e às demais pessoas, fomentar a cooperação, a autoconfiança e a confiança em suas companheiras e seus companheiros, com base no conhecimento da forma de agir de cada pessoa (...). A realização destes objetivos leva a formas de convivência mais satisfatórias e à melhoria da qualidade de vida das pessoas, qualidade de vida que não se baseia no consumo, e sim em gerir adequadamente os recursos mentais, intelectuais e emocionais – para alcançar uma convivência humana muito mais satisfatória. (SASTRE, MORENO, 2002, p.49)
Gestão participativa da escola pública
No sistema público de ensino, o poder autoritário do Estado se instala na direção da escola, dentro de um modelo clássico de administração que não permite a participação, o compartilhar de idéias, a liberdade para expressar-se e a democracia nas decisões. A participação é muitas vezes, limitada, controlada e puramente formal, causando assim a acomodação das pessoas que não se mobilizam e ficam esperando serem orientadas ou aceitam passivamente as decisões das “autoridades competentes”.
Além disso, uma gestão autoritária pode dificultar a boa vontade de alguns educadores, desestimulando-os por completo com relação a isso. Segundo Luck (2008, p. 25) tem-se que:
(...) tais situações lembram o que foi apontado por Cardoso (1995) ao condenar práticas de pseudo-democracia promovida mediante falta de gestão articuladora competente, orientação do senso comum, resistência à mudança, falta de visão e de orientação por valores educacionais, dentre outros aspectos.
Contudo, a democratização da escola e a participação na gestão escolar não são doações, são direitos[2]. A gestão escolar participativa é um exercício de cidadania que possibilita ao coletivo escolar (pais, alunos, funcionários, professores) participar nos processos decisórios que acontecem no interior da escola. Como considera Paro (2002, p. 12):
A escola, assim, só será uma organização humana e democrática na medida em que a fonte desse autoritarismo, que ela identifica como sendo a administração (ou a burocracia, que é o termo que os adeptos dessa visão preferem utilizar), for substituída pelo espontaneísmo e pela ausência de todo tipo de autoridade ou hierarquia nas relações vigentes na escola.
O uso da autoridade pela direção escolar deve ter o cuidado de não se estender a um modelo vertical de poder e hierarquia, devendo essencialmente privilegiar as relações horizontais entre os integrantes da comunidade escolar, mediando discussões e trocas de idéias, numa atitude que legitima as verdadeiras ações democráticas. Administrar a escola pública torna-se, assim, uma via de acesso ao envolvimento da comunidade escolar na democratização da gestão escolar. Essa prática favorece o despertar de diálogos não só entre os profissionais da educação, mas entre eles e a sociedade que financia sua existência. Para Weffort (1995, p. 99),
(...) a escola que se abre à participação dos cidadãos não educa apenas às crianças que estão na escola. A escola cria comunidade e ajuda a educar o cidadão que participa da escola, a escola passa a ser um agente institucional fundamental do processo da organização da sociedade civil.
Para que isso aconteça é necessário que o poder seja descentralizado do Estado e transferido oficialmente para as unidades escolares. E, na escola, que ele seja transferido da direção da escola para a comunidade escolar. A direção funcionando como um mediador das relações entre os diversos segmentos escolares, que administra com a comunidade e não a comunidade escolar. Através da descentralização do poder criam-se relações sociais opostas às relações autoritárias e celebra-se a democracia enquanto forma prática de autonomia e tomada de decisão dentro da escola. Segundo Gadotti (1995, p 202)
(...) descentralização e autonomia caminham juntos. A luta pela autonomia da escola insere-se numa luta maior pela autonomia no seio da própria sociedade. Portanto, é uma luta dentro do instituído, contra o instituído, para instituir outra coisa. A eficácia dessa luta depende muito da ousadia de cada escola em experimentar o novo caminho de construção da confiança na escola e na capacidade dela resolver seus problemas por ela mesma, confiança na capacidade de autogovernar-se.
Cabe lembrar que a educação atual, marcada vigorosamente pelos princípios que norteiam a pós-modernidade, está em crise. Nessa época de incertezas e fragmentações, a educação recebida dos pais e das escolas, os valores éticos e morais, assim como a solidez do casamento e da família, estão perdendo espaço para novas formas de comportamento ditadas pelas leis do mercado. E é justamente na escola que essa crise parece aflorar com maior evidência: nunca antes se discutiu tanto a falta de limites no comportamento dos alunos, o desrespeito na sala de aula e sua desmotivação; nunca houve tantos professores cansados e depressivos; nunca a frustração esteve tão presente na vida escolar.
As condutas dos educandos nos obrigam a tentar saídas e intervenções coletivas. Por que essas formas de ser são tão surpreendentes em crianças e adolescentes? De onde elas vêm? Da escola? Das condições sociais e morais em que são socializadas fora das escolas? Poderiam ter sido evitadas? Temos poder de evitá-las? Ao menos dispomos de condições materiais e de artes para tratá-las? (ARROYO, 2007, p. 21).
Perplexos, os professores debatem formas de tentar superar as dificuldades de se ensinar. Tem-se a sensação de que se algum caminho não for encontrado, em breve não se conseguirá mais ensinar. Em sala de aula, a indisciplina e a falta de respeito se agigantam a cada dia. A educação escolar é vista pelo educando como algo enfadonho, comprometendo o aprendizado dos conhecimentos e tornando a tarefa do professor num esforço sobre-humano para ensinar ao menos o mínimo, já que boa parte de sua energia é destinada cotidianamente a impor limites.
Acomodados à aceitação passiva das decisões das “autoridades competentes” e conformados com uma vida social controlada, o grande desafio da escola atual é ter pais participativos. A desculpa mais comum pela não participação dos pais na escola é a falta de tempo em função da jornada de trabalho. A família, outrora referencial de educação das crianças e dos adolescentes, diante do clima de urgência e velocidade das exigências da vida na pós-modernidade, não dispõe sequer de meios suficientes para transmitir aos seus filhos princípios e valores morais de respeito ao outro, quanto mais para participar na vida escolar de seu filho. Via de regra os pais estão ausentes na vida dos filhos. Como escreveu Morin (2000, p. 70)
O século XX foi o da aliança entre duas barbáries: a primeira vem das profundezas dos tempos e traz guerra, massacres, deportação, fanatismo. A segunda, gélida, anônima, vem do âmago da racionalização, que só conhece o cálculo e ignora o indivíduo, seu corpo, seus sentimentos, sua alma, e que multiplica o poderio da morte e da servidão técnico-industriais.
A escola não pode substituir a função da família. Enquanto tenta fazer o papel da família, ela deixa de lado seus próprios afazeres. Por outro lado, as falhas causadas pela não-participação dos pais na vida de seus filhos sugerem a possibilidade da criação de mecanismos na escola que possam trazer a comunidade escolar para dentro da escola, com atividades pedagógicas que, além do aluno, exigem a participação da família. (WERNECK, 2001, p.91). No rumo destas ponderações, Bastos (2002, p. 58) nos diz que:
[...] a escola necessita da adesão de seus usuários (não só de alunos, mas também de seus pais ou responsáveis) aos propósitos educativos a que ela deve visar, e que essa adesão precisa redundar em ações efetivas que contribuam para o bom desempenho do estudante.
A escola pública brasileira precisa de novas estratégias que garantam um mínimo de qualidade, que assegure a efetividade do desempenho da escola. Essas estratégias de mudança precisam ser integradoras e certamente podem ser iniciadas com a aproximação entre as famílias e a escola. Uma comunidade escolar propriamente dita sem dúvida, surgirá dessa integração. Como cita Werneck “São boas as escolas que estão em sintonia com a comunidade”. Nas palavras de Paro (2001, p. 27), “Se a escola não participa da comunidade, por que irá a comunidade participar da escola?”. Como toda ação democrática a gestão escolar participativa é um caminho que se faz ao caminhar.
Nesse sentido, o jogo de xadrez, que vem trazendo ótimos resultados nas escolas públicas, sugere a possibilidade de sua utilização como estratégia de ação pedagógica para a efetivação da gestão participativa. Ou seja, uma atividade pedagógica que alem do educando exija ainda a participação de seus pais, levando-os a conhecer e refletir sobre o comportamento dos seus filhos na escola, bem como reconhecerem sua importância no papel de educar em parceria com a escola. Rappaport et al. (2002) afirmam que, Quando as relações familiares privilegiam a resolução dos conflitos por meio do diálogo e onde há uma troca afetuosa entre pais e filhos, a criança e o adolescente sofrerão menos as influências negativas dos conteúdos dos meios de comunicação, em especial os da televisão.
O jogo de xadrez na escola
Algumas reflexões colhidas a partir da realidade escolar e desenvolvidas durante os estudos realizados no Programa de Desenvolvimento Educacional do Estado do Paraná, turma de 2009, levaram a considerar a importância do jogo de Xadrez como estratégia de ação para a construção de uma gestão escolar participativa. Nesse sentido, pretendo incentivar os alunos das 5º séries do período da manhã, do Colégio Estadual 29 de Abril, do município de Guaratuba, a jogarem xadrez. Após terem dominado o jogo e suas regras básicas, esses alunos deverão incentivar seus pais a aprenderem a jogar xadrez, o que proporcionará novos conhecimentos para os pais, trabalhando, ainda, questões imprescindíveis ao aprendizado como auto-estima, concentração, atenção, raciocínio lógico, dentre outras. Porém, a grande meta é resgatar os pais, para que participem no contexto educacional na formação dos seus filhos, numa perspectiva de gestão escolar participativa.
Relativamente conhecido o jogo de xadrez é, todavia, difícil de definir. De certa forma pode-se dizer que esse é uma simulação de uma batalha entre duas nações medievais, representados por peças com diferentes funções, sobre um tabuleiro de oito por oito casas quadriculadas, somando um total de 64 casas de cores alternadas. Seu objetivo é dar xeque mate ao rei adversário. No xeque mate há um tipo de ataque ao rei adversário de forma que ele não tenha mais defesa ou fuga. Cada jogador possui 16 peças: um rei, uma dama, duas torres, dois bispos, dois cavalos e oito peões. Oportuna é aqui também a definição do famoso poeta, romancista e cientista alemão GOETHE (1786), para quem “O xadrez é a ginástica da inteligência”. MELÃO JÚNIOR (1998), contudo, refere-se ao xadrez de forma mais ampla e poética, definindo-o como:
O xadrez não passa de um punhado de tocos de pau, dispostos sobre uma tábua quadriculada, situada entre duas criaturas incompreensivelmente absortas, que, dominadas por uma espécie de autismo, desperdiçam inutilmente seu tempo, olhando para este brinquedo sem graça, enquanto o mundo ao seu redor pode desmoronar sem que se apercebam disso. Esta é a interpretação do homem vulgar, insensível e apático; incapaz de enxergar as essências, homem que se conforma com uma visão superficial das coisas e se deixa seduzir pelas aparências de outras atividades menos belas e eloqüentes. Para o homem mediano, o xadrez é um mero acessório, útil tão somente porque contribui para desenvolver diferentes faculdades mentais, melhorando o desempenho escolar nas crianças, intensificando a acuidade mental nos adultos e preservando por mais tempo a agilidade mental nos idosos. Porém, para o homem espirituoso, criativo e empreendedor, o xadrez é uma das mais ricas fontes de prazer, um meio no qual se encontram elementos para representar as mais admiráveis concepções artísticas, um campo pelo qual a imaginação pode voar livremente, produzindo, com encantadora beleza, idéias deliciosamente sutis e originais. O xadrez é uma das raras e preciosas atividades em que o homem pode explorar ao fundo suas emoções, atingindo estados de prazer tão sublimes, tão ternos, tão intensos, que só podem ser igualados pelas sensações proporcionadas pelo amor e pela música.
Um dos grandes problemas trazidos pela pós-modernidade é a visão quase sempre parcial e fragmentada que temos das coisas à nossa volta. Nesse sentido, um dos grandes desafios da escola é o de conseguir formar alunos dentro de uma perspectiva integral da educação. Para que ele possa ver o movimento da vida como uma coisa só, não estática, sempre dinâmica, e não como fragmentos. A vida é um todo que retrata todas as faces do ser humano, suas crenças, seus medos, seus conflitos, suas incertezas, sua angústia, seu funcionamento fisiológico e principalmente psicológico. Não se pode entender o ser humano a partir de uma parte isolada de seu comportamento, de sua postura ideológica, por exemplo, ou de sua condição étnico-cultural.
O mundo atual, privado e cercado pelas muralhas de um suposto conhecimento, mas é como se além da informação e do consumo nada mais existisse, exige que o educando tenha acesso ao raciocínio lógico que o contato com os saberes acumulados que a humanidade produziu pode fornecer como possível resposta para seus problemas.
Um dos maiores dilemas que a contemporaneidade oferece cotidianamente ao ser humano é a sensação de estar encurralado diante de situações. Nesse momento, a mente não consegue raciocinar de uma forma lógica, desaparecem as respostas prontas, como que por encanto não se consegue ver a saída. Na maioria das vezes isso ocorre porque o homem atual está condicionado a ver a realidade de modo fragmentado. Buscar a solução dos problemas pelos seus efeitos é um grande equívoco, pois a conseqüência de um problema pode ter como origem outro problema esquecido ou mal resolvido e assim sua origem permanecerá oculta.
Uma visão parcial cria um individuo temeroso de tudo que possa encontrar além da sua área de atuação. Para resolver um problema é preciso vê-lo como um todo. Essa bem que poderia ser a primeira diretriz que deveríamos passar para nossos filhos e alunos. Teríamos um jovem questionador, disposto a aceitar não apenas porque aquilo lhe é imposto, mas porque assim concluiu. Fazer sem questionar é o caminho mais fácil, mas um indivíduo só se torna questionador quando sabe que para cada questão há sempre uma solução. No jogo de xadrez, uma visão ampla mostra não apenas o adversário que está diante de si, mas também todo ambiente à sua volta, todos os demais protagonistas que fazem parte da cena e todas as possíveis saídas. Às vezes o jogador de xadrez pode pensar que está completamente encurralado. Mas, revendo novamente a situação, dessa vez como um todo, ampliando sua visão, percebe que há uma saída para o problema. O problema exista apenas devido à sua visão fragmentada do jogo.
Um jogador de Xadrez, ao ver o tabuleiro por inteiro, pode avaliar melhor o problema que tem diante de si, sua origem e os recursos que têm para tentar solucioná-lo Considerando a situação como um todo o enxadrista tem uma visão privilegiada, aprendendo como superar, no futuro, cada dificuldade que se apresente. A atenção é sem dúvida o mais importante. O jogo de xadrez desperta esse estado essencial para a existência humana que é a atenção diante do surgimento acelerado de conceitos inéditos e provisórios que destroçam as grandes crenças do passado em nome de um questionável relativismo onde as éticas, os fatos e a própria realidade parecem desaparecer. As sociedades sempre consumiram, mas na sociedade contemporânea o que está para além das aparências é a ênfase dada ao consumo de coisas efêmeras apresentadas ao consumidor como essenciais. Esta nova fase do capitalismo avançado, multinacional e de consumo caracteriza um período onde as mudanças tecnológicas são tão amplas e rápidas que possamos senti-las e refletir sobre elas. O tempo é tão somente aquele que nos permite aceita-las.
No ensino do xadrez, assim como na vida, o aluno deve ser orientado a perceber a realidade para além de sua aparência. Com a visão total da realidade, a consciência se amplia e a pessoa terá a seu favor na solução de qualquer questão da vida a lógica que o ensinará a sistematizar e organizar uma questão antes de tentar resolvê-la. Nesse sentido, Vigotsky (2003, p.125), afirmou que:
Da mesma forma que uma situação imaginária tem que conter regras de comportamento, todo jogo com regras contém uma situação imaginária. Jogar xadrez, por exemplo, cria uma situação imaginária. Por quê? Porque o cavalo, o rei, a rainha, etc. só podem se mover de maneiras determinadas; porque proteger e comer peças são, puramente, conceitos de xadrez. Embora no jogo de xadrez não haja uma substituição direta das relações da vida real, ele é, sem dúvida, um tipo de situação imaginária. O mais simples jogo com regras transforma-se imediatamente numa situação imaginária, no sentido de que, assim que o jogo é regulamentado por certas regras, várias possibilidades de ação são eliminadas. Assim como fomos capazes de mostrar, no começo, que toda situação imaginária contém regras de uma forma oculta, também demonstramos o contrário - que todo jogo com regras contém, de forma oculta, uma situação imaginária. O desenvolvimento a partir de jogos em que há uma situação imaginária às claras e regras ocultas para jogos com regras às claras e uma situação imaginária oculta delineia a evolução do brinquedo das crianças.
Diante dessas ponderações, o jogo de xadrez já se qualifica como um precioso coadjuvante pedagógico na escola, uma vez que os conhecimentos adquiridos ao estudar e aplicar as regras do jogo podem ser transferidos para o estudo e análise das situações concretas da vida cotidiana. Além disso, embora não represente em si um instrumento de educação formal, se tomarmos as peculiaridades deste jogo e as projetarmos ao campo educativo podemos perceber que o xadrez cria hábitos de estudo, estimula a atitude de proceder com método e fomenta o desejo de superação mediante o conhecimento.
Breve história do xadrez
A falta de documentação torna muito difícil se precisar a época da invenção do xadrez. Contudo, historiadores discutem sobre várias possibilidades. Parece que o registro mais antigo que há sobre o xadrez é uma antiga pintura egípcia que mostra duas pessoas jogando algo parecido com o jogo cerca de 3000 anos aC. Entretanto, aceita-se, costumeiramente, como introdução à história do xadrez uma lenda indiana que posiciona muito bem a condição intelectual e psicológico desse jogo. Nas palavras de Becker (1971, p. 259):
Pela lenda, o xadrez foi inventado há 1950 anos por um hindu de nome Sissa, a fim de distrair o seu rei. Ao conhecer o jogo, o rei da Índia ficou tão entusiasmado que ofereceu a Sissa a liberdade de escolher o que ele bem desejasse como recompensa por tão notável invento. Toda a corte esperava que Sissa fosse pedir grandes riquezas, mas ele surpreendeu a todos com o seguinte pedido: um grão de trigo pela primeira casa do tabuleiro; dois grãos de trigo pela segunda casa; quatro grãos de trigo pela terceira casa; oito grãos de trigo pela quarta casa e assim sucessivamente, sempre dobrando o número de grãos da casa anterior até a casa de número sessenta e quatro (o tabuleiro de xadrez tem 64 casas). Seu pedido provocou risos. O rei meio que contrariado disse-lhe: “Um invento tão brilhante e um pedido tão simples? Escolha uma grande riqueza meu jovem, um de meus castelos, um palácio ou até uma de minhas mulheres!” Mas Sissa mostrava-se inapelável à proposta do rei, e, como palavra de rei é palavra de rei, este, ainda contrariado, pediu a seus criados que entregassem a Sissa um grande saco de grãos de trigo. Sissa entretanto, recusou a oferta dizendo que queria receber exatamente o que havia pedido, nem um grão a mais, nem um grão a menos. O rei pediu então para que seus calculistas fizessem as contas. Depois de muito tempo e muitas contas, o matemático oficial do reino chegou assustado para avisar ao rei que eles encontraram o número 18.446.744.073.709.551.615 de grãos de trigo a serem pagos ao jovem Sissa, ou seja, dezoito quintrilhões, quatrocentos e quarenta e seis quatrilhões, setecentos e quarenta e quatro trilhões, setenta e três bilhões, setecentos e nove milhões, quinhentos e cinqüenta e um mil e, seiscentos e quinze. É um número tão grande de grãos de trigo, que seria necessário semear seis vezes a superfície da terra para obtê-lo. Se uma pessoa contasse de um até este número, gastando um segundo por número, levaria quase sessenta bilhões de séculos para chegar até ele. Vendo-se incapacitado em cumprir a promessa, o rei mandou chamar Sissa para lhe oferecer outra recompensa. Sissa, entendendo a aflição do monarca por não poder cumprir sua promessa perdoou a dívida, afinal, seu objetivo havia sido atingido, ou seja, chamar a atenção do monarca para o cuidado que deveria ter com suas promessas e julgamentos e para reconhecer que atitudes aparentemente humildes formam grandes conquistas. Por fim, Sissa aceitou ser conselheiro do rei e todos viveram felizes para sempre.
Em 1913, Harold James Ruthven Murray publicou o livro “Uma História do Xadrez”. Nesta obra, o autor declara de forma convincente em mais de 900 páginas que o xadrez foi inventado na Índia, em 570. Segundo Murry (1913) a chaturanga era um jogo de quatro elementos, que teria sido o ancestral do atual xadrez. Jogavam quatro pessoas, sendo que cada uma possuía oito peças: um ministro (hoje dama), um cavalo, um elefante (hoje bispo), um navio (mais tarde uma carruagem, hoje a torre) e quatro soldados (atualmente os peões). Seu tabuleiro era monocromático (de uma só cor) e as peças dos quatro jogadores diferenciavam-se pelas cores vermelha, verde, negra e amarela. A peça a ser movimentada era definida por um lance de dados. Este jogo indiano teve três evoluções: num primeiro momento, eliminaram-se os dados; posteriormente, os jogadores em diagonal unem-se (aliados) e mais tarde, os aliados passaram para o mesmo lado do tabuleiro. Através de rotas comerciais e culturais o chaturanga é exportado para a China tornando-se lá o "Jogo do Elefante" e posteriormente o "Jogo do General" no Japão e na Coréia.
Na Pérsia ele passa a ser chamado de "Jogo de Xadrez" (em persa chatrang) e goza de imensa popularidade. É nesta época que o número de parceiros é reduzido a dois e cria-se uma nova peça; o Xã (Rei). Com a Pérsia sendo conquistada pelos árabes (por volta de 651 dc) estes adotam e difundem o jogo pela África e Europa. No século XI, o xadrez já é conhecido em toda a Europa e sofre a seguinte modificação: o Ministro torna-se Rainha (Dama). Na verdade o jogo ao adentrar a Europa começa a apresentar um aspecto monárquico.
No século XIII as casas do tabuleiro passam a ser dividas em duas cores para facilitar a visualização dos enxadristas. Por volta de 1561 o padre espanhol Ruy Lopez de Segura idealiza a criação do roque, movimento que será aceito na Inglaterra, França e Alemanha somente 70 anos depois. O movimento en passant já era usado em 1560 por Ruy Lopez, embora não se conheça seu criador. O duplo avanço do peão em sua primeira jogada surge em 1283, em um manuscrito europeu. Entretanto, a principal alteração que sofrerá o xadrez acontecerá aproximadamente em 1485, na renascença italiana, surgindo o chamado xadrez da "Rainha Enlouquecida", pois até esta época a rainha só podia deslocar-se uma casa por vez pelas diagonais, os bispos, que se moviam em diagonal de duas casas, passam a ter, também, movimentos mais longos. Os peões que chegam à última fila são promovidos a uma peça já capturada.
Em 1851 abre-se a era moderna do xadrez com o Primeiro Torneio Internacional durante a Primeira Exposição Universal de Londres, que foi vencido pelo alemão Adolf Anderssen. Anderssen teve inúmeros sucessores, mas os que mais se destacam são o pai do xadrez moderno, Wilhelm Steinitz (1836-1900) e seu sucessor, Emanuel Lasker (1868-1941). Steinitz é tido como um Aristóteles do xadrez. Seus planos são novos, baseado no acúmulo de pequenas vantagens que o adversário cede, se consideradas separadamente, nada representam, mas acumuladas podem construir uma vantagem decisiva.
O mérito de Steinitz está em perceber que a teoria de uma partida de xadrez gira em torno de um delicado equilíbrio de forças. Para conseguir vantagem em um desses elementos, tempo, espaço e matéria, deve-se ceder algum outro tipo de vantagem de igual ou aproximado valor. Em outras palavras, nada se obtém grátis em uma partida bem equilibrada de Xadrez. Steinitz foi campeão mundial por 28 anos, de 1866 a 1894. Já Emanuel Lasker, que derrotou Steinitz, é considerado uma das maiores personalidades da história do Xadrez. Doutor em filosofia e matemático via o xadrez como uma constante luta de duas vontades. Como teórico procurou desvendar os princípios fundamentais que regem a conduta da partida de xadrez. Seu estilo consiste em desequilibrar a posição, nem sempre realizando as melhores jogadas, mas sim os lances mais desagradáveis para cada adversário.
A este estilo criado por Lasker, dá-se o nome de "Escola Psicológica". Após ser Campeão Mundial por 27 anos, de 1894 a 1921, Lasker perde o título para o cubano José Raul Capablanca. Todavia duas alterações importantes no panorama enxadrístico internacional merecem ainda menção: Em 1924, é fundada em Paris a Fédération International Des Échces, a FIDE, que hoje é a segunda maior federação esportiva do mundo, ficando atraz apenas da FIFA (Federação Internacional de Futebol e Associados) em número de países filiados. Em dezembro de 1986 a FIDE e a UNESCO criam a Comission For Chess In Schools que tem um importante papel na difusão do ensino e na democratização do Xadrez enquanto instrumento pedagógico utilizado nas escolas.
A Confederação Brasileira de Xadrez existe desde 06 de novembro de 1924. Em 1986 – FIDE – ONU – UNESCO criaram a comissão para xadrez nas escolas, visando a difusão deste esporte como instrumento pedagógico e cultural.
Alguns enxadristas que marcaram a história da humanidade: Albert Einsten, Oswaldo Cruz, Newton, Rousseau, Leibintz, Chopin, Dante, Beethoven. O jogo de xadrez, considerado por muitos anos, como um jogo para as classes privilegiadas, hoje é defendido por educadores e filósofos, como um excelente treino para todos, considerado um dos jogos mais populares do mundo. Esporte clássico e cheio de charme, onde duas pessoas jogam, com o objetivo do xeque-mate, que na língua persa quer dizer: “o rei está morto”.
O tabuleiro é campo de batalha das peças, sendo 64 casas divididas entre pretas e brancas, normalmente. Tem-se 8 linhas e 8 colunas e 26 diagonais. Composto de 16 peças brancas, 16 peças pretas, num total de 32 peças. As peças brancas começam sempre a partida.
Das 16 peças, temos 1 rei, 1 dama, 2 bispos, 2 cavalos, 2 torres, 8 peões. Na captura das peças, tira-se a peça capturada do adversário e coloca a própria peça no lugar da que saiu.
O Xadrez como ferramenta pedagógica
Tem-se como objetivo para o presente trabalho, que, no Colégio 29 de Abril no município de Guaratuba, no Estado do Paraná, que o Xadrez seja utilizado como uma ferramenta pedagógica, contribuindo assim, com todas as disciplinas no processo educacional de uma forma interdisciplinar. Também, de modo educativo e estratégico, ensinar xadrez para os pais ou responsáveis, é um meio das crianças se aproximarem mais de seus familiares.
Somando a isso, pretende-se no decorrer da intervenção pedagógica no estabelecimento, fazer com que os adultos sintam a importância desse jogo no contexto educacional, uma vez que essa atividade é benéfica e afasta os alunos das ruas, drogas e criminalidade. Tendo consciência disso, eles poderão participar e contribuir, mais ativamente, junto à escola, numa gestão verdadeiramente participativa.
Com o intuito de contribuir nessa qualidade de ensino, no Colégio 29 de Abril, o projeto de xadrez para os pais, veio como forma estratégica, para contribuir com a Educação e levar a família a refletir sobre sua importância em todo contexto educacional. Acrescenta-se que ensinar os pais a jogarem xadrez, é um desafio possível, embora muitos tabus existam, como por exemplo, “ser um jogo muito difícil e de elite”. Uma vez que os pais aprendam o jogo, vão contribuir, incentivando seus filhos a jogar mais, e jogando com eles, automaticamente estarão mais próximos da escola. Esses pais, Jogando e compreendendo suas regras, com o passar do tempo, conseguem enxergar os benefícios do jogo, e contribuição na superação das dificuldades dos seus filhos.
De acordo com Bettelheim (2002, p. 12) “através de uma brincadeira de criança, podemos compreender como ela vê e constrói o mundo, o que ela gostaria que ele fosse quais suas preocupações e que problemas a estão assediando”. Outra relação do xadrez e os seus benefícios são com a Educação Especial, os jogos de xadrez tem demonstrado especial resultados para alunos com dificuldades de aprendizagem ou com deficiência. Enfim, quando a criança joga, ela experimenta, descobre, exercita, inventa, confere suas habilidades.
Na educação dos alunos o Xadrez é considerado atividade muito importante, uma vez que permite o desenvolvimento afetivo, cognitivo, motor, social, moral e a aprendizagem de conceitos. Uma vez estimulada sua curiosidade, iniciativa e autoconfiança, proporciona assim a aprendizagem, desenvolvimento da linguagem, do pensamento e da concentração e atenção. Quanto ao papel do professor, ele ajudará as crianças e adolescentes a compreender os conteúdos e superar as dificuldades. No papel de investigador, ele procurará saber como pensa a criança, para melhor ajudá-la.
Observa-se que as crianças sentem-se ao mesmo tempo “prestigiada e desafiada” quando joga com adultos, isso porque o jogo torna-se mais estimulante e rico. Portanto, conclui-se que o Xadrez, considerado como patrimônio cultural de toda humanidade, independente de fronteiras, criado pelos homens, veio para contribuir na formação dos alunos. Utilizar-se do jogo de xadrez na escola, como uma estratégia para uma gestão verdadeiramente participativa, onde os familiares dos alunos de quinta série, do ensino fundamental do período da manhã, terão a oportunidade de conhecer e aprender este jogo torna o projeto um meio em si, para alcançar esses objetivos propostos.
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[1] Professor da turma 2007 do PDE (Programa de Desenvolvimento Educacional), UEM, lotado no Colégio Estadual Gatão Vidigal, em Maringá, Paraná.
[2] A Constituição Federal – Capítulo da Educação, art. 206, inciso VI - afirma que a gestão democrática do ensino público deve ser na forma da lei. A Lei é a LDB (Lei Nº. 9.394, de 20 de dezembro de 1996.), Art. 3, inciso VIII, segundo a qual o ensino será ministrado com base na gestão democrática do ensino público, na forma desta Lei e da legislação dos sistemas de ensino; Art. 14: Os sistemas de ensino definirão as normas de gestão democrática do ensino público na educação básica, de acordo com as suas peculiaridades e conforme os seguintes princípios:
I= participação dos profissionais da educação na elaboração do PP da escola;
II= participação das comunidades escolar e local em conselhos escolares ou equivalentes.
Publicado por: Giancarlo
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